Mulheres impulsionam a restauração ecológica da caatinga
Grupos formados majoritariamente por mulheres atuam na recuperação da Caatinga, por meio de um projeto implementado na Área de Proteção Ambiental (APA) da Chapada do Araripe, no Ceará.
Em janeiro de 2022, o projeto Semeando conhecimento na Caatinga para o fortalecimento das cadeias produtivas associadas à recuperação da biodiversidade, executado pela Fundação Araripe, iniciou tendo como um dos focos o uso sustentável do bioma para o desenvolvimento da socioeconomia regional. Para recuperar áreas degradadas e conservar o semiárido, o projeto também busca melhorar práticas agrossilvipastoris – que combina pecuária, lavoura agrícola e plantio de árvores – e promover a coleta, o beneficiamento e o armazenamento de sementes, além da produção de mudas de espécies florestais nativas prioritárias ou em extinção no bioma.
A região se caracteriza pela presença de matas bem preservadas e comunidades locais que trabalham com o extrativismo e a relação tradicional com frutos nativos – como pequi, fava d’anta, maracujá-peroba, mangaba e coco-babaçu –, mas, também, de áreas degradadas pela ação humana – sobretudo pela prática relacionada ao uso do fogo no bioma.
Comunidades locais de seis municípios participam do projeto, até o momento: Porteira, Jardim, Barbalha, Crato e Santana do Cariri, no Ceará. Para definir as ações potenciais em cada comunidade, a equipe técnica no projeto entendeu a diversidade biológica, as práticas usadas por agricultoras e agricultores familiares e extrativistas e os interesses e conhecimentos de quem habita os territórios.
“Quando o projeto começou, fomos muito bem recepcionados. O pessoal estava sedento por apoio. Queriam, por exemplo, implementar sistemas agroflorestais, melhorar o manejo da terra e melhorar a renda”, explica a coordenadora técnica do projeto, Daniele de Carvalho Siebra.
Nas comunidades, constatou-se que 80% eram formadas por mulheres. Estima-se que 300 pessoas – entre mulheres e homens que trabalham no extrativismo e na agricultura familiar – sejam impactadas pelas ações do projeto.
Em Porteiras (CE), um grupo de mulheres já trabalhava no extrativismo da fava-d’anta, o que motivou o projeto a incentivar que a espécie arbórea nativa fosse cultivada por agricultoras e agricultores familiares.
O projeto também apoia a retomada das atividades na unidade de beneficiamento da Associação de Mulheres do Sítio Macaúba, em Barbalha (CE). Lá, 30 mulheres fazem a extração do óleo e produzem luminárias, passarelas de mesa, cortinas e biojóias do coco-babaçu.
“O projeto prepara o ambiente para que, no futuro, possa haver uma produção que vise processos de restauração que fortaleçam as ações socioprodutivas. O pessoal vai plantar pequi nos quintais das casas, nas estradas, nas áreas degradadas. O mesmo vale para outros frutos nativos. Aos poucos, essa ação coletiva fará com que a restauração agregue valor ao dia a dia das famílias”, avalia o coordenador-geral do projeto, Francisco Campello.
Coleta de sementes e produção de mudas
“São desafios para a recuperação da Caatinga a disponibilidade de sementes de espécies nativas e, depois, como fazer a muda chegar em áreas de plantio. E, claro, a sensibilização das pessoas envolvidas em todo o processo é chave para o sucesso do trabalho”, conta Daniele.
O projeto vem realizando capacitações e rodas de conversa para sensibilizar agricultoras e agricultores familiares e extrativistas sobre o uso sustentável da biodiversidade, manejo e conservação do solo e recuperação da vegetação nativa com plantio de mudas e coleta de sementes.
“Os momentos de formação são riquíssimos. Quem participa sai com experiências maravilhosas. Como comunidade, ganhamos conhecimento, união e nos fortalecemos, o que também é muito importante para as nossas famílias”, aponta Rosilene, pequena produtora rural na comunidade Sítio Lírio.
Os encontros têm gerado frutos. Um ponto alto do projeto é que representantes das comunidades fazem a coleta de sementes e cooperam para produzir mudas. Metade das comunidades – são oito no total – contam com viveiros comunitários já em funcionamento. A outra metade produz mudas de espécies nativas no quintal das casas.
Nas comunidades Sítio Lírio, em Santana do Cariri (CE), e Baixa do Maracujá, no Crato (CE), dois grupos de mulheres desenham a parceria de um negócio de futuro: enquanto o primeiro grupo vem sendo fortalecido para cuidar das áreas nativas e fornecer sementes, o segundo produzirá mudas de espécies nativas em um viveiro que está sendo recuperado com o apoio do projeto.
“Não poderíamos imaginar isso no começo do projeto. Só foi possível porque proporcionamos intercâmbios. Visitamos comunidades na Chapada do Araripe. Conhecemos cooperativas na Bahia. Vimos experiências que iam além da nossa realidade, que tinha possibilidade e poderia virar negócio. A transformação é lenta, mas o resultado é positivo”, afirma Daniele.